After Laughter marca um retorno sarcástico e emotivo de Paramore


Apesar de todas as dificuldades, os nossos queridos do Paramore, para a nossa sorte, não parecem estar pensando em desistir e nos provam isso com a renovação e o experimentalismo presente no novo trabalho deles. Prepare-se para cantar sobre tempos difíceis e enxugar as lágrimas enquanto dança ao som retrô de After Laughter, que marca o início de uma era extremamente promissora!

Não é de hoje que o Paramore é obrigado a dar a volta por cima, aconteceu em 2010 com a saída dos irmãos Farro e novamente em 2015 com a saída do baixista Jeremy Davis, que subsequentemente ainda processou a líder Hayley Williams, algo que a abalou profundamente, deixando então incerto o futuro da banda. O plot-twist veio com o retorno do baterista Zac Farro, que renovou os ânimos e os transformou em trio novamente.

After Laughter tira sarro dos contratempos da vida e traz consigo o lema “cry hard, dance harder”, que descreve incrivelmente bem todo o clima em torno do álbum. Os instrumentais em sua maioria são bastante upbeat, que contrastam com letras tristes e por vezes até trágicas, como foi o caso do carro-chefe “Hard Times”. Um ponto interessante é que o divórcio da líder Hayley Williams não é diretamente citado, mas é claramente o tema central de algumas canções do disco, assim como as várias saídas de integrantes pelas quais a banda passou.

De todas as faixas, a que provavelmente ironiza mais o tema principal é a própria “Hard Times”, que abre o disco. A canção fala sobre sofrer um grande choque de realidade e se sentir incapaz de atingir seus objetivos. O instrumental incorpora elementos de pop rock, synthpop e principalmente de new wave, deixando a sonoridade oitentista extremamente predominante na faixa. Até por representar muito bem a sonoridade do álbum, essa foi sem dúvidas a melhor escolha possível não apenas para lead single, mas para faixa de abertura.


“Rose-Colored Boy” mostra que o Paramore preza pela transparência e faz uma crítica, ainda que bem-humorada, ao fato da grande mídia sempre sugerir que os artistas pareçam felizes, ainda que não estejam. A canção segue bem de perto a mescla dançante de synthpop e new wave da faixa anterior, mas aposta ainda mais pesado nos sintetizadores, fato que deve agradar a crítica, mas com certeza fará os fãs mais conservadores se contorcerem um pouquinho.

Os lampejos de indie pop e a levada funk de “Told You So” dão uma leve acalmada nos ânimos, mas não te deixam parar de dançar. Taylor York fez um trabalho incrível na guitarra da canção e deu a ela uma identidade extremamente única. A letra não parece ser sobre alguém ou algum evento específico, mas apresenta um certo clima de desabafo e fala da frustração de lidar com pessoas que vigiam cada ação sua, esperando que você cometa um erro, apenas para poder dizer “eu te avisei”.


A power ballad “Forgiveness” às vezes te confunde num turbilhão de emoções e até tenta não ser direta, mas nos dá pequenas pistas de que é sobre a relação de Hayley e seu ex-marido Chad Gilbert, dando a entender que ela deseja ser capaz de perdoá-lo em algum momento no futuro, mas agora o ressentimento ainda existe e, portanto, é cedo demais para que isso aconteça. O instrumental da canção carrega fortes influências do soft rock e lembra muito a sonoridade do Fleetwood Mac, que é notadamente uma das bandas favoritas de Hayley.

A ironia da temática do álbum fica escancarada em “Fake Happy” que começa lenta e suave, como quem não quer nada, tornando-se uma canção dançante não mais que de repente. As notas de sintetizador que abrem as portas para baixo e bateria, carregam consigo alguns dos versos mais inesperados do disco e deixam clara a evolução vocal de Hayley, que abusa das high notes. O produtor Justin Meldal-Johnsen também fez um ótimo trabalho no baixo e isso também fica bastante evidente.


“26” é uma verdadeira aula de como transformar sentimentos profundos e intensos em uma bela canção. O instrumental começa com um simples violão, que é logo acompanhado por um lindo arranjo de cordas, que fazem dessa uma canção única na discografia da banda. A letra, que é claramente autobiográfica, faz alusão ao momento depressivo vivido por Hayley antes das gravações do álbum. A vocalista fala consigo mesma no passado e pede para que ela (e de certa forma o ouvinte) mantenha as esperanças, ainda que tudo pareça perdido.

A cereja do bolo “Pool” prova, do início ao fim, que é um dos maiores acertos do álbum, talvez até mesmo da carreira da banda. A canção possui um instrumental brilhante (em vários sentidos da palavra), cada elemento foi colocado em seu devido lugar e volume, destacando tudo, mas sem deixar absolutamente nada sobressalente, ainda que os teclados de fato sejam o backbone da música. A letra é tão genial quanto e descreve de forma metafórica o lado obscuro e, de certa forma, obsessivo de uma relação em que duas pessoas se desencontram com frequência, mas insistem, por pura paixão, em continuar tentando.


A felicidade finalmente dá as caras na dançante “Grudges”, a única canção alegre do disco. O nostálgico instrumental da faixa foi criado por Taylor e Zac, de forma até despretensiosa. Hayley por sua vez decidiu que aquilo pedia uma letra tão nostálgica quanto e escreveu sobre ter retomado a amizade com o baterista, que inclusive canta na ponte da canção. Parece que não foram apenas os fãs que ficaram muito felizes pela volta do velho Zac.

Aparentemente nosso trio andou ouvindo ska (talvez os primeiros discos do No Doubt?) durante as gravações do álbum e a influência disso aparece no instrumental de “Caught In the Middle”, que traz uma levada mais morna, porém ainda bem contrastante com o tema central da canção. A letra traz quase uma crise existencial de Hayley, girando em torno do fato de ela estar envelhecendo, não saber o que esperar do futuro ou muito menos como lidar com o passado, o que pode ser outro vestígio da depressão enfrentada por ela.


“Idle Worship” vai te fazer dançar uma última vez com sua levada que oscila entre o esquisito e o melódico, além de vocais extremamente marcantes que dão ainda mais força à acidez da canção. Na letra, Hayley é bem direta e desmistifica a imagem que algumas pessoas têm dela própria, deixando bem claro que ela é humana, falha e comete erros como todo mundo, ironizando ainda o fato de que ela um dia já pensou estar preparada para qualquer coisa que a vida lhe reservasse, algo que ela posteriormente descobriu, da pior forma, não ser verdade.

Apesar de manter a batida da faixa anterior, sua irmã obscura “No Friend” inverte o clima geral do disco, com uma linha de baixo nada alegre e um riff insistente de teclado, que dão a ela uma estranheza até então inédita na carreira da banda. Pela primeira vez na história do Paramore, Hayley não faz os vocais principais e sim Aaron Weiss da banda MewithoutYou, que recita versos que vão de pura poesia a partes de canções e até mesmo de e-mails, ou seja, não há canto, apenas uma espécie de discurso intenso e profundo.


Se “26” foi emocional, não há adjetivo possível para o que ouvimos ao final do álbum.

A sensibilidade e delicadeza de “Tell Me How” a tornam os quatro minutos mais tocantes e sinceros de todo o álbum, não só pelo instrumental significativamente quieto e arrastado da canção, mas pela letra da mesma e tudo que gira em torno dela. Com uma sensação de pesar, Hayley traduz sentimentos essencialmente confusos e faz referência aos integrantes que a banda perdeu com o passar dos anos, que não por acaso eram alguns dos melhores amigos dela. Nos versos finais, um clima de despedida toma conta de vez e, de maneira até abrupta, o disco se encerra, mas de certa forma não fecha a porta, apenas a deixa entreaberta.


Da primeira nota à última, After Laughter é uma obra de arte incontestável e de longe o trabalho mais inspirado e bem produzido da banda até o presente momento. A parceria entre Taylor York e Justin Meldal-Johnsen se provou muito positiva e deu vida a um álbum muito consistente e imprevisível. Quem gostava da antiga sonoridade da banda, provavelmente não vai entender de onde saiu esse Paramore retrô oitentista e isso é compreensível, mas o fato é que a mudança foi benéfica e expôs nuances desses três músicos que nunca haviam sido exploradas antes.

O que transparece no fim das contas, é que After Laughter foi feito de coração aberto para que fosse recebido da mesma forma. É seguro dizer que o objetivo foi atingido.

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